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Catadora quebra paradigmas e compõe música sobre a dignidade de ser catador

Em um cenário onde há a predominância da força masculina, e que ainda é permeado de muito preconceito e humilhação pela sociedade, a catadora de materiais recicláveis Cacilda Souza de Almeida, 38 anos, moradora da cidade de Ourinhos – SP, desponta, quebrando paradigmas, ao fazer e compartilhar um vídeo, cantando uma música de autoria própria, com a intenção de “mostrar para a sociedade que somos trabalhadores e dignos de respeito.”, diz ela.

Cacilda cresceu no lixão. Quando tinha 5 anos de idade, seu pai faleceu e sua mãe, que era dona de casa, casou-se novamente com um rapaz que, na época, trabalhava como catador de recicláveis no lixão da cidade. Para ajudar nas despesas da casa, Cacilda virou catadora também. Com o seu padrasto aprendeu tudo o que sabe hoje: como coletar os materiais recicláveis (diferenciar os materiais, como separar e vendê-los), a importância dessa atividade para a humanidade e a importância de se trabalhar com união para agregar valores (tanto financeiros quanto humanos). Aprendizados que ela, durante o período que trabalhou no lixão, fez questão de compartilhar com todos que estavam na mesma lida.

Tem muito orgulho e amor pelo que faz. Com 36 anos parou, temporariamente, de trabalhar como catadora para terminar seus estudos (interrompidos quando mais jovem), e concluir o Ensino Médio. Durante esse período de pausa, trabalhou como balconista de mercado e, em seguida, analista de qualidade em uma fábrica de derivados de sorvetes. Após a conclusão do Ensino Médio, voltou a ser catadora. Perguntada sobre o porquê de voltar a exercer essa função, a mesma responde o seguinte: “Eu não aguento ver injustiça e sei que sozinha não posso fazer muita coisa. Tenho muitos companheiros e companheiras que não tiveram a mesma oportunidade de estudar como eu tive e sofrem muito preconceito. Para lutar por eles, nada melhor que ser como eles, sentir na pele os mesmos sofrimentos. Muitas pessoas prometem muitas coisas, mas não passam de promessas, porque não viveram e não sabem o quanto é difícil provar que é um trabalho honesto e digno de respeito. Só por isso.”

Cansada de ser desprezada nas ruas e sofrer preconceitos por ser catadora, a “Rainha da Sucata” – como é conhecida na cidade por sempre ter feito artesanatos de materiais reaproveitados para si própria (como vasos feitos com garrafas de vidro, animais feitos de papelão, quadros, etc.) -, resolveu compartilhar na internet, em seu perfil de uma rede social, vídeos e fotos, mostrando suas criações. Começou aí, a receber inúmeras curtidas pela sua arte. Porém, quando ia trabalhar pelas ruas como catadora, as mesmas pessoas que curtiam na rede social, não a enxergavam. Era como se ela não existisse. Com o intuito de mudar essa visão, postou em sua rede social uma foto dela com um “bag” (grande bolsa feita de polipropileno de alta resistência muito usada no transporte de materiais recicláveis) na cabeça, mostrando às pessoas como se sustentava. A partir daí, começou a ser elogiada pelo que faz e é reconhecida por onde passa.

Uma condição muito comum entre trabalhadores dessa classe, os catadores, ainda são invisíveis em muitos setores da sociedade ou quando vistos, muitas vezes são tidos como ladrões, drogados e alcoólatras. Aproveitando a visibilidade que estava tendo com a exposição de sua profissão, Cacilda decidiu fazer a música com a única missão de conscientizar as pessoas que catador não é drogado, alcoólatra ou qualquer outra coisa que o diminua da condição de ser humano. “Nunca bebi nada de álcool, nunca fumei e nunca nem vi drogas. Não tinha porque eu ser tratada como lixo. E todos os catadores passam por isso.”, relata a catadora. Para compor a música, religiosa que é, relata que pediu orientação a Deus: “Eu orei e pedi a Deus uma canção para tocar a sociedade. Ao amanhecer, comecei a escrever”. No dia seguinte, Cacilda compartilhou o vídeo cantando sua música e, através de sua grandiosa e nobre história de vida, nos encheu de inspiração e motivação para uma luta que é de todos nós.

A catadora Cacilda Souza sentada em um banco improvisado para a gravação de seu vídeo: um vaso sanitário abandonado em um terreno baldio, cheio de larvas de mosquito, por ela reaproveitado
A catadora Cacilda Souza sentada em um banco improvisado para a gravação de seu vídeo: um vaso sanitário que estava cheio de larva de mosquito, abandonado em um terreno baldio, por ela reaproveitado.

A letra da música e o vídeo da catadora você pode conferir abaixo:

“Catador também é gente” – por Cacilda Souza de Almeida

Pessoas pobres que nunca fogem da luta

E as noites são tão curtas, pois madrugam para viver

Essa é a vida de um catador

Revira o seu lixo e faz isso com prazer.

Em muitas vezes somos taxados de imundo

Maconheiro, vagabundo e até mesmo de ladrão

Mas, na verdade, somos povo abençoado

Pois limpamos com orgulho o lixo da nossa nação.

Passo minha tarde reciclando o seu lixo

Esse é meu compromisso, não só para me sustentar

Pois tenho visto muitas casas desabando

E os rios transbordando de tanto lixo que há.

O catador anda por todos os lados

Com seu carrinho pesado sem nunca desanimar

Humilhado, zombado e criticado

Sempre deixado de lado pelo seu modo de andar.

De agora em diante, tenha essa consciência

Catador também é gente e devemos respeitar

Somos humanos e moramos nessa terra

Temos que cuidar bem dela

Então vamos reciclar!

E para você que acha isso absurdo,

Faço do lixo luxo, isso posso te provar.

Faça a sua parte: separe o seu lixo

Esse é seu compromisso

E pare, sim, de reclamar.

Leia mais em nossa página:

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