A Ecomarapendi é a ONG (organização não-governamental) responsável pela Recicloteca. Além do centro de informações de meio ambiente e reciclagem, oferece diagnóstico participativo, estudos de impacto ambiental e de vizinhança, treinamento e capacitação. Entre em contato pelo email contato@ecomarapendi.org.br
Fechar janela

Após modismo, sustentabilidade ganha maturidade nos planos das marcas

Por Renata Leite, do Mundo do Marketing

A palavra sustentabilidade entrou para o vocabulário das corporações brasileiras após a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente e o Desenvolvimento (também conhecida como Cúpula da Terra ou Eco-92), realizada em 1992. A popularização do termo, entretanto, ocorreria ao longo dos anos 2000, década em que as empresas perceberam que se atrelar ao conceito poderia resultar em importantes vantagens competitivas. Foi um período em que o tema esteve presente no discurso, mas nem sempre na prática, o que acabou por gerar uma certa desconfiança dos consumidores. Hoje, nota-se mais cautela e timidez na comunicação de feitos responsáveis do ponto de vista socioambiental, demonstrando o alcance de um novo patamar de maturidade do mercado.

Em 2012, 60% dos brasileiros já tinham ouvido falar sobre sustentabilidade, o que representa um crescimento significativo do nível de conhecimento, considerando-se que, em 2010, esse percentual era de 44%, segundo levantamento feito pelo Instituto Akatu em parceria com a GFK Brasil. Por estarem mais informados, os consumidores também passaram a duvidar mais do que divulgam as empresas em termos de responsabilidade social e ambiental e apenas 8% acreditam, e 40% afirmam que “depende” nas ações das companhias. A credibilidade está relacionada a qual empresa propagou as informações e em qual meio de comunicação elas foram transmitidas.

Nesse processo de evolução, as marcas que mantinham um discurso vazio perceberam que não poderiam continuar com a prática, sob o risco de, em vez de aumentarem a credibilidade, a prejudicarem. “Antes, as empresas se autodenominavam as mais sustentáveis de seus setores nas peças de divulgação, mesmo se estivessem fazendo muito pouco. Hoje, se ouve menos falar sobre o tema, não necessariamente porque o assunto foi deixado de lado, mas porque as organizações estão mais cautelosas. Estamos num período de amadurecimento”, afirma Romualdo Ayres, Coordenador de Pós-Graduação em Gestão de Franquias da ESPM e Diretor de Sustentabilidade da ABF Rio, em entrevista ao Mundo do Marketing.

Regulamentação pressiona por consistência
O próprio Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) criou normas para a publicidade da responsabilidade socioambiental e da sustentabilidade. Entre as regras definidas pelo órgão estão as exigências de se evitar “conceitos vagos que ensejem acepções equivocadas ou mais abrangentes do que as condutas apregoadas” e de “dispor de dados comprobatórios e de fontes externas que endossem, senão mesmo se responsabilizem pelas informações socioambientais comunicadas”. A entidade ainda ressalta que não “serão considerados pertinentes apelos que divulguem como benefício socioambiental o mero cumprimento de dispositivos legais e regulamentares a que o anunciante se encontra obrigado”.

A maior vigilância do Conar reflete a cobrança também da intensificação da pressão por relevância das ações por parte da sociedade em geral. Fazer o básico já não é mais considerado um diferencial. “As empresas se veem hoje com o desafio de fazer melhorias em sua própria estrutura. Certos discursos já não geram impacto porque as pessoas estão mais críticas. A divulgação de informações vagas já não cola mais. Quando o tema voltar à tona, vai vir com mais qualidade, porque existe um movimento de preparação no mercado para um novo período da economia verde”, afirma Carolina Piccin, Sócia-Diretora da Matéria Brasil, em entrevista ao Mundo do Marketing.

As empresas que buscam se alinhar aos preceitos de sustentabilidade devem, primeiramente, estar regularizadas com as exigências legais, tais como documentos que autorizam o funcionamento, emitidos pelos Bombeiros, pelas prefeituras e demais órgãos reguladores, e o pagamento de impostos. O passo seguinte é olhar para as despesas com consumo de água, energia e outros recursos. Há ainda a necessidade de se verificar a retidão em relação ao tratamento com os funcionários, que devem ser contratados em regime de CLT, com benefícios como plano de saúde. De nada adianta fazer ações de caridade e não olhar para dentro do próprio negócio.

Preocupação com a cadeia produtiva
A responsabilidade socioambiental não só está ao alcance das pequenas e médias empresas, como também pode ser definitiva para a contratação delas pelas grandes corporações. “As multinacionais querem passar uma imagem coerente, o que as faz investir na construção de uma boa reputação. Para isso, é fundamental ter insumos que venham de fornecedores que adotem as boas práticas. A preocupação vem dos próprios acionistas, que querem eliminar riscos de atuar com pequenas empresas que não tenham políticas de controle de questões ambientais e sociais”, destaca Marcus Nakagawa, Sócio-Diretor da iSetor, em entrevista ao Mundo do Marketing.

Os possíveis danos à imagem causados por problemas na cadeia produtiva ficaram evidentes recentemente, nas últimas denúncias feitas à indústria da moda em relação ao uso de mão de obra escrava. As irregularidades são flagradas, em geral, em fornecedores, mas a condenação da sociedade recai sobre o grupo varejista. Foram tantas as incidências que a ONG Repórter Brasil lançou, em 2013, um aplicativo que aponta as redes que já foram autuadas por fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego. O APP Moda Livre busca incentivar que o usuário faça a escolha das marcas que veste de forma consciente.

Para evitar denúncias do tipo, a fabricante de embalagens cartonadas Tetra Pak audita todos os seus fornecedores semestralmente. Os esforços fazem parte de um plano bem maior de construção de uma imagem sustentável para a empresa, que consumiu R$ 17 milhões de investimento em 2013. Os recursos aplicados não podem ser desperdiçados por conta de falhas na cadeia produtiva. Todo o trabalho da Tetra Pak é estimulado por conta de a companhia atuar em um setor crítico para a poluição do planeta.

Embalagens são ponto crítico do consumo
As embalagens descartáveis costumam ser acusadas como responsáveis pela morte de muitos animais, em especial os marinhos, por conta da demora na biodegradação delas no meio ambiente. Para minimizar os danos e, consequentemente, os riscos para a perpetuidade da empresa, a Tetra Pak apoia mais de 600 cooperativas com 4,5 mil pontos de coleta. Com isso, a taxa de reciclagem das embalagens longa-vida no Brasil atingiu o patamar de 30% da produção em 2013, um crescimento de 9% em relação a 2012, chegando a 71 mil toneladas de produtos da fabricante.

A companhia passou também a fabricar no Brasil, em abril de 2014, todas as suas embalagens cartonadas com plástico verde, derivado da cana-de-açúcar em vez de combustíveis fósseis. A mudança atingiu todos os 13 bilhões de itens produzidos pela empresa anualmente para 150 clientes. Combinado ao papel, o polietileno de baixa intensidade aumenta o percentual de materiais renováveis na embalagem para até 82%. O biopolímero sustentável tem as mesmas propriedades físicas e químicas do tradicional.

As ações direcionadas à sustentabilidade incluem não só melhorias tecnológicas – a meta é chegar a um cartonado 100% reciclável –, como também na redução de desperdícios nas fábricas (98% já são reutilizados) e no apoio a mais de 600 cooperativas com 4,5 mil pontos de coleta extras. Atualmente, 12 profissionais atuam na área ambiental da companhia, fora os 25 consultores que fazem a ponte entre a empresa, as cooperativas e entre os sucateiros. A nova legislação federal, que tem como objetivo pôr fim aos lixões no país, também pressiona e responsabiliza as empresas pelos resíduos que seus produtos geram após o consumo final.

O papel educativo
A educação e a preservação ambiental dita os rumos da Tetra Pak. “O primeiro passo dentro de uma empresa é convencer o próprio colaborador a respeito do tema, o que já começamos a fazer 20 anos atrás. É um dever da corporação educar o público interno e o externo também sobre o diferencial dos produtos responsáveis. Na visão do consumidor, sustentabilidade está essencialmente relacionada à poluição e aquecimento global. Ainda não conseguimos detectar até que ponto essas preocupações influenciam a decisão de compra hoje, mas certamente existe uma tendência. As empresas que quiserem ter sucesso no futuro precisam começar a pensar sobre o tema hoje”, garante Fernando von Zuben, Diretor de Meio Ambiente da Tetra Pak, em entrevista ao Mundo do Marketing.

De acordo com uma pesquisa da Nielsen, realizada em junho de 2014, 67% das pessoas dizem que preferem trabalhar para empresas socialmente responsáveis e 55% pagam mais por produtos e serviços de empresas comprometidas com impacto social e ambiental positivo. São dados que estimulam ainda mais corporações e direcionarem esforços para a criação de valor compartilhado, já que apontam para uma predisposição.

Em 2012, 50% se disseram inclinados a pagar mais por produtos sustentáveis e, em 2011, 45%. “Nos últimos três anos, a predisposição tem aumentado, o que não quer dizer que as pessoas estejam efetivamente aceitando gastar mais e abrir mão de um bem-estar adquirido em nome da sustentabilidade. Ainda existe uma lacuna entre a intenção e a pressão sobre o a administração do orçamento doméstico. A grande motivação ainda é melhorar o padrão de consumo, mas a Geração Millenium já começa a quebrar esses padrões”, diz Ricardo Alvarenga, Gerente de Análises Especiais da Nielsen, em entrevista ao Mundo do Marketing.

De olho na próxima geração e no bem-estar dos funcionários
É de olho nesses consumidores mais conscientes que a Braskem também investe em alternativas responsáveis para suas resinas termoplásticas. O plástico verde da companhia, que substitui o derivado do petróleo pela cana de açúcar, é o utilizado pela Tetra Pak. A companhia conta ainda com ações de responsabilidade socioambiental, como o Ser + Realizador, que nasceu em 2009 para apoiar as cooperativas de catadores.

Há ainda o projeto Fábrica de Florestas, que tem a missão de promover o desenvolvimento sustentável da região em que a empresas atua. “Investimos na preservação ambiental no entorno das nossas plantas. Entendemos que precisamos preservar os distanciamentos das áreas residenciais e industriais, por meio desses corredores, além de entendermos que nossos integrantes trabalham de modo mais feliz com o verde no entorno”, resume André Leal, Líder de Responsabilidade Social da Braskem, em entrevista ao Mundo do Marketing.

Este texto está protegido por uma Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional
Link para atribuição de créditos: http://www.recicloteca.org.br/?p=13287

Gostou desse post?

A Ecomarapendi é a ONG (organização não-governamental) responsável pela Recicloteca. Além do centro de informações sobre meio ambiente e reciclagem, oferece diagnóstico participativo, estudos de impacto ambiental e de vizinhança, treinamento e capacitação.

Assuntos relacionados

Compartilhe nas redes sociais

Deixe um comentário